6.12.05

Uma vida de insecto

Acordar de manhã, vestir depressa, ir para o trabalho, reunião importante.
Quase adormecer na dita reunião importante. Passar o dia enfiado num escritório a ler e a escrever coisas escritas e lidas por outros de mesma condição, sabendo que pouco há-de resultar de tantas palavras. Temer os gestos, expressões de rosto e os pensamentos dos que estão acima de si na hierarquia da empresa e odiar-se repugnadamente pela tibieza de tal comportamento. Passar o dia rodeado de estranhos que se conhece há mais de cinco anos. Voltar a casa tarde porque havia muito que fazer, jantar um jantar ensosso aquecido no micro-ondas, ver meia-hora de televisão antes de ir para a cama cedo para repetir a mesma coisa outra vez no dia seguir. Que consolo pode haver, mesmo quando se deita ao pé de alguém que por vezes se amou até à loucura, mas que neste momento não parece mais do que apenas uma banalidade, um dado adquirido, monotonamente encontrado a cada dia que passa. Perguntar-se se isto não será afinal, o fim da história, embora a vida continue, para lá da esperança, uma coisa entorpecida a voar em piloto automático. No meio disto tudo, ficar feliz por se ler no jornal que nunca na história da humanidade tantos viveram com tanto luxo e conforto e tão pouca necessidade, e saber-se que se é um felizardo entre esses felizardos.
Pensar:
"Um filho, devia ter um filho"
ou
"Num dia destes ainda me junto a uma seita fanática qualquer e estoiro-me pelo ar."

Aprender de uma vez por todas:

Nada vale a pena
e a alma não existe
para ser pequena.